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Como a Coréia do Sul teve sucesso em conter a pandemia

Alexandre B. Cunha

As diversas nações do mundo reagiram de formas distintas à pandemia da Covid-19. Discute-se neste texto a estratégia adotada pela Coréia do Sul, país que teve considerável sucesso em lidar com o problema em questão.

A tabela a seguir contém algumas informações referentes às mortes causadas pela pandemia no Brasil, na Coréia do Sul, na Espanha, nos Estados Unidos e na Itália.

Tabela 1

mortes devido à Covid-19 em países selecionados

Fonte dos dados básicos: Worldometer/Coronavirus e Worldometer/Population. Dados obtidos às 20h55min do dia 15 de abril de 2020.

Considere inicialmente o total de mortes (segunda coluna da esquerda para a direita). As informações ali apresentadas sugerem que a Coréia do Sul teve mais sucesso do que os outros quatro países considerados em conter o vírus.

O problema de se analisar tão somente o número total de óbitos que é tal procedimento ignora o fato de os países terem populações distintas. Isto é, não se pode descartar a hipótese que a diferença no número de mortes na Coréia do Sul e, por exemplo, no Brasil seja decorrente do fato da população brasileira ser superior à sul-coreana. Os dados referentes às mortes por 100 mil habitantes (terceira coluna da esquerda para a direita) estabelecem que esse não é o caso. Na verdade, dentre todas as nações consideradas, a Coréia do Sul tem a menor de taxa de mortalidade.

Por fim, também é preciso levar em conta o momento em que a Covid-19 foi introduzido em cada país. Afinal de contas, é natural que um país em que o vírus chegou há poucos dias tenha menos mortes (totais e por 100 mil habitantes) do que outro em o vírus já está presente há semanas. Como é não possível ter certeza de quando o vírus foi introduzido em cada nação, utiliza-se como aproximação a data da primeira morte causada pela Covid-19 (última coluna à direita). Pode-se verificar que quando comparado aos outros quatro países, provavelmente o Brasil ainda está em um estágio inicial da pandemia.

Ainda é cedo para analisar o desempenho de cada uma das diversas nações em lidar com a pandemia. Dentre outros motivos, isso se deve ao fato de que a Covid-19 ainda está se espalhando pelo mundo. Adicionalmente, os dados de alguns países (por exemplo, China, Coréia do Norte e Irã) não são confiáveis. De toda forma, as informações contidas na Tabela 1 deixam claro que a Coréia do Sul efetivamente teve sucesso, relativamente à experiência internacional, em reduzir as mortes causadas pela Covid-19.

Em nenhum momento a Coréia do Sul adotou um confinamento generalizado. Essencialmente, a estratégia adotada pelo país consistiu em rastrear, testar e tratar (trace, test, and treat em inglês). No final deste texto há um apêndice com links para alguns textos sobre a política em questão.

Verificação de temperatura no aeroporto sul-coreano de Incheon. Fotógrafo: Jens-Olaf Walter. Fonte: Flickr.

As linhas gerais da estratégia sul-coreana são de simples compreensão. Para cada caso confirmado da enfermidade, rastreiam-se as pessoas que possivelmente tiveram contato com o doente. Todas elas são testadas. Pessoas com resultado positivo mas que não têm sintomas entram em quarenta residencial. Indivíduos infectados com sintomas são tratados em casa. Por fim, os casos mais sérios são encaminhados para um hospital.

O rastreamento dos contatos é parte mais complexa da política. Não é difícil localizar os familiares e os colegas de trabalho de cada indivíduo que contraiu a Covid-19. Porém, faz-se muito mais do que isso. Utilizam-se os dados do celular e dos cartões de crédito de cada infectado para identificar os locais pelos quais ele passou recentemente. Essas informações são postadas na internet de forma que cada sul-coreano possa verificar se ele esteve próximo de alguma pessoa infectada. Adicionalmente, um indivíduo cujo sistema de localização do celular sugere que ele estive próximo de algum doente é alertado por meio de uma mensagem de SMS.

Um problema dessa estratégia é que ela invade a privacidade das pessoas, especialmente das infectadas. Porém, tendo em vista o que o confinamento envolve uma restrição generalizada dos direitos de ir e vir, de trabalhar etc. de toda a população, então a política adotada pela Coréia do Sul é superior ao que se fez em vários outros países também pelo ângulo de respeito aos direitos individuais.

Encerra-se este ensaio com três comentários que serão relevantes para os próximos textos deste blog. Primeiro, apesar de não ser um país grande, a Coréia do Sul também não é uma cidade-estado como Mônaco e Cingapura. Atualmente a sua população é igual a 51,7 milhões de habitantes, superior aos 46,8 milhões da Espanha Por outro lado, sua a área é aproximadamente igual a 100 mil quilômetros quadrados, superior a de países como Hungria e Portugal.

Segundo, foi fundamental para o sucesso da estratégia de rastrear, testar e tratar que ela tenha sido adotada tão logo foram detectados os primeiros casos da Covid-19 na Coréia do Sul. Como o número de pessoas infectadas ainda era baixo, a estrutura que país possui para combater as epidemias não foi sobrecarregada por uma grande quantidade de doentes. Esse aspecto é importante para o atendimento médico dos enfermos e também para o rastreio e o teste dos contatos.

Terceiro, é comum se encontrar na imprensa internacional menção ao grande número de testes realizados na Coréia do Sul. Isso pode sugerir que a estratégia de rastrear, testar e tratar requer que se teste uma parcela considerável da população. Todavia, isso não é verdade. De acordo com o site https://www.worldometers.info/coronavirus/, até a data de hoje a Coréia do Sul realizou 534,5 mil testes, o que corresponde a um pouco mais de 1% da sua população.


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Apêndice: links

Coronavirus in South Korea: How ‘trace, test and treat’ may be saving lives

What the U.S. Needs to do Today to Follow South Korea’s Model for Fighting Coronavirus

South Korea is reporting intimate details of COVID-19 cases: has it helped?

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