Artigo publicado no jornal Correio Braziliense em 17 de agosto de 2016 (página 11).
Alexandre B. Cunha
O Brasil presentemente enfrenta uma das mais fortes recessões, senão a maior, da sua história. Essa crise foi causada pelas políticas econômicas que foram implantadas no final do governo Lula e magnificadas durante a gestão de Dilma Rousseff. Dentre os diversos equívocos daquelas políticas, destaca-se um legado de desarranjo nas contas públicas que colocou em xeque a solvência do estado brasileiro.
O país não voltará a crescer de forma duradoura sem que haja um forte ajuste fiscal. A razão para tanto é muito simples. Não ocorrendo o ajuste em questão, pelo menos um dos seguintes cenários se concretizará: (1) haverá uma inadimplência do governo federal; (2) o país passará a conviver com taxas de inflação de mais elevadas. A mera perspectiva de que algum desses cenários possa se concretizar é absolutamente deletéria para a atividade econômica. Os investidores retiram capital do país. As empresas adiam ou cancelam os seus projetos de expansão. A incerteza se alastra e a economia entra em recessão. Desta forma, a confiança por parte de indivíduos e organizações de que o governo irá restabelecer o equilíbrio das contas públicas é uma condição necessária para a retomada do crescimento.
A atual situação da economia brasileira e a relevância da questão fiscal para o crescimento econômico suscitam duas indagações. A primeira consiste em questionar quais são as medidas que podem reverter o quadro atual. A resposta é relativamente simples: redução dos gastos públicos e/ou elevação das receitas. A dimensão exata da utilização de cada uma dessas opções será determinada pelo processo de negociação política entre o Executivo e o Legislativo.
A segunda indagação está relacionada, mas não é equivalente, à primeira. Ela pode ser colocada da seguinte forma: que ações devem ser tomadas para impedir a repetição do desajuste fiscal que lançou o Brasil na crise atual? As medidas que constituem a resposta da primeira pergunta não são suficientes para equacionar a segunda. A razão para tanto é que aquelas medidas não garantem que um futuro governante não promoverá um novo desastre fiscal.
A resposta para a última pergunta não é necessariamente simples. Contudo, pelo menos uma lição de fácil compreensão emerge da crise atual. O desequilíbrio fiscal não surgiu repentinamente. A sua construção teve início ainda no governo Lula. Em 2009 o superávit primário foi inferior a 3% do PIB, algo que não ocorria desde 1998. A partir daquele ano, houve uma tendência de deterioração das contas públicas que terminou por gerar um déficit primário de 1,9% em 2015. A imprensa brasileira já mencionava pelo menos desde janeiro de 2013 o uso da ‘contabilidade criativa’, um logro que tinha como objetivo burlar a boa prática contábil e gerar superávits fiscais fictícios. A trajetória da dívida pública bruta também forneceu evidências do problema. No final de 2013, essa variável correspondia a 51,7% do PIB. Ao fim de 2014 e 2015, a relação em questão foi respectivamente igual a 57,2% e 66,5%.
Os fatos acima relatados mostravam de forma inequívoca a existência de um sério desequilíbrio fiscal. Diversos analistas alertaram para esse problema. As agências internacionais de classificação de risco também o identificaram. Tivesse o Congresso Nacional, que tem competência e poder para legislar sobre questões orçamentárias, realizado uma intervenção (diretamente ou através do TCU) quando surgiram as primeiras notícias sobre a ‘contabilidade criativa’, rejeitado os repetidos orçamentos com superávit primário inferior a 3% do PIB e estabelecido um teto para a dívida pública, então o Brasil não teria mergulhado na presente crise.
Dito isto, compete à Câmara e ao Senado dar o primeiro e principal passo para impedir a ocorrência de uma nova crise fiscal. Aquelas casas não podem atuar como meras agências homologatórias de decisões presidenciais. Elas precisam desempenhar de forma efetiva a sua obrigação constitucional de fiscalizar e controlar o Executivo.
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