Alexandre B. Cunha
Frequentemente, pessoas supostamente esclarecidas alegam que o sistema capitalista é responsável pela existência da pobreza. Por exemplo, em artigo publicado em 1996 na Folha de São Paulo, um conhecido sociólogo afirmou que o capitalismo possui uma lógica “geradora da miséria em escala mundial”. De forma similar, uma professora universitária escreveu em um texto relativamente recente que “a pobreza é uma invenção do capitalismo”. Assim sendo, não é de surpreender que uma tese de doutorado defendida na USP afirme que “a pobreza e a desigualdade, não sendo exclusivas do capitalismo, persistem e crescem neste modo de produção”. A despeito da sua popularidade, afirmativas como essas são completamente contrárias à realidade.
Não é preciso um grande esforço intelectual para se dar conta de que existem alguns problemas com a tão propalada ideia de que o capitalismo gera pobreza. A título de ilustração, considere o caso do Brasil. De acordo com o IBGE, em 2017 a expectativa de vida ao nascer era igual a 76 anos, ao passo que em 1950 a mesma estatística era igual a 48 anos. E, como o leitor bem sabe, muitos brasileiros hoje têm acesso a recursos como internet, telefone celular e forno micro-ondas que nem sequer existiam durante a primeira metade do século anterior. Logo, mesmo no Brasil (que está longe de ser um bom modelo de economia capitalista) o progresso ocorrido nas últimas décadas permite que os seus atuais habitantes vivam por períodos mais longos e de forma mais confortável do que os seus antecessores. Como pode ser isso compatível com a ideia de que o capitalismo cria pobreza? Ora, o problema é que referida ‘ideia’ é, pura e simplesmente, uma falácia.
O economista britânico Angus Maddison foi um dos principais pesquisadores da área de História Econômica. O seu excelente livro Contours of the World Economy, 1–2030 AD: Essays in Macro-Economic History (Nova Iorque: Oxford University Press, 2007) contém várias estatísticas relevantes para o problema abordado neste ensaio. No caso específico da renda per capita mundial, as informações disponibilizadas por Maddison permitem que se elabore o seguinte gráfico.
Gráfico 1
Renda per Capita Mundial em US$
Esse gráfico revela três pontos essenciais para a presente discussão:
- A renda per capita mundial decresceu de US$ 467 para US$ 450 nos mil anos que se seguiram ao nascimento de Cristo. Ou seja, ela permaneceu quase inalterada no período em questão. Consequentemente, não houve crescimento econômico ao longo do penúltimo milênio.
- A renda per capita mundial cresceu de U$ 450 para US$ 667 nos 820 anos do período 1000-1820. Em média, isso corresponde a um crescimento de aproximadamente 0,05% ao ano, o que é uma taxa bastante modesta.
- A renda per capita mundial passou de US$ 667 para US$ 6516 nos 183 anos do período 1820-2003. Ou seja, nesse período relativamente curto a renda média se multiplicou por um fator quase igual a 10. Em termos anuais, houve um crescimento médio de 1,25%.
Em síntese, a humanidade se defrontou com 1000 anos de estagnação seguidos por outros 820 nos quais o crescimento foi muito modesto. Somente após a Revolução Industrial a economia mundial entrou em uma trajetória de crescimento acelerado. Em outras palavras, nos últimos 200 anos o ser humano desfrutou, graças ao capitalismo, de uma prosperidade ímpar.
A próxima tarefa a ser executada neste ensaio consiste em ilustrar, com base em algumas informações estatísticas, o que a aludida prosperidade significou para o ser humano. Os dados mundiais (ou seja, para todo o planeta) referentes à expectativa de vida ao nascer, disponíveis na tabela que se segue, demonstram o extraordinário impacto do progresso econômico sobre o bem-estar da humanidade.
Tabela 1
Expectativa de Vida ao Nascer (Dados Mundiais)
Uma pessoa nascida em 1820 viveria 26 anos em média. Tal valor é apenas dois anos maior que o seu correspondente no ano 1000. Contudo, uma criança nascida em 2017 viverá, em média, até os 72 anos. Ou seja, nos oito séculos que antecederam a Revolução Industrial a expectativa de vida cresceu apenas 2 (= 26 – 24) anos; por outro lado, em um período um pouco inferior a dois séculos houve um crescimento de 46 (= 72 – 26) anos.
A evolução da população mundial também evidencia como o capitalismo impactou, positiva e consideravelmente, o bem-estar da humanidade.
Tabela 2
População Mundial
Essa tabela fala por si só. De toda forma, convém ressaltar que no período de 1000 até 1820 a população mundial cresceu em média 0,17% ao ano, ao passo que de 1820 a 2017 houve um incremento anual médio de 1,01%.
O progresso gerado pelo capitalismo também permitiu que uma fração consideravelmente menor dos trabalhadores se dedicasse à produção de alimentos. Infelizmente, os dados disponíveis não permitem que se elabore uma tabela similar às duas acima. Todavia, ainda assim é possível apresentar algumas evidências desse fenômeno. De acordo com Maddison (2007, p. 76), em 1820 a agricultura respondia por 37% dos empregos do Reino Unido; a estatística equivalente para os EUA era igual a 70%. Em 2003, respectivamente 1% e 2% das pessoas empregadas no Reino Unido e nos EUA trabalhavam no campo. Adicionalmente, os dados do Banco Mundial mostram que, nas últimas décadas, a percentagem da população mundial que vive no campo vem caindo a cada ano. Logo, é possível concluir que o capitalismo contribuiu para que, ao contrário do que ocorria no passado, a vida humana não mais se resuma a produzir e/ou obter alimentos.
É natural que o leitor se pergunte se o capitalismo também foi benéfico para os pobres. Afinal de contas, não é impossível que em média o ser humano tenha uma vida cada vez mais longa e confortável enquanto os menos favorecidos tenham ficado para trás. Contudo, isso não ocorreu. Na verdade, ao contrário do que se alega usualmente, a pobreza vem caindo. A Tabela 3 informa, para diversos anos a partir de 1981, a percentagem da população mundial que vivia com menos que US$ 1,90 por dia. Vale ressaltar que foram incluídos na tabela todos os anos para os quais o Banco Mundial disponibilizou a percentagem em questão.
Tabela 3
Percentagem da População Mundial
Vivendo com Menos que US$ 1,90 por Dia
Surpreendente, não? Em 1981, 42,1% das pessoas viviam com menos que US$ 1,90 por dia; em 2015, a mesma estatística havia caído para 10,0%. Em termos absolutos, em 1981 e 2015 havia, respectivamente, 1,9 bilhão e 734 milhões de seres humanos na situação em questão. Consequentemente, apesar do crescimento da população mundial, um número consideravelmente menor de indivíduos se encontra em uma situação de aguda pobreza. Em outras palavras, a realidade é exatamente contrária à propaganda esquerdista: ao invés de ampliar a pobreza, o capitalismo a está reduzindo.
Há que se ressaltar que vários outros dados apontam na mesma direção. Por exemplo, os indicadores de mortalidade infantil, de favelização, de alfabetização e de acesso à telefonia móvel, à internet e à rede elétrica também fornecem um impactante testemunho de como o bem-estar material dos seres humanos tem crescido de forma consistente durante os últimos anos.
Ao longo dos últimos duzentos anos a humanidade experimentou uma prosperidade jamais vista na história. O ser humano passou a viver por períodos mais longos e com mais conforto e saúde. As curtas vidas de nossos ancestrais se resumiam quase que exclusivamente à produção e busca de alimentos, ao passo que nós podemos nos dedicar a diversas outras atividades. Muitas das comodidades que hoje desfrutamos simplesmente não existiam há poucas décadas. E tudo isso se deve ao capitalismo. De fato, a economia de livre mercado nos proporcionou, em escala global, um progresso que nenhum governo foi capaz de gerar, seja a nível nacional, estadual ou municipal. Por mais que muitos professores, intelectuais, políticos, jornalistas e artistas afirmem o contrário, a verdade é que o capitalismo nos resgatou da pobreza.
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