Rio de Janeiro, . | Direito, Governo


Sobre a legalidade do confinamento

Alexandre B. Cunha

O confinamento impõe diversas restrições aos cidadãos, às empresas e às demais organizações. Surpreendentemente, apesar disso praticamente não se discute no Brasil a legalidade da referida política. Este texto contém uma breve análise dessa questão.

Estátua da Senhora Justiça (Lady Justice em inglês). Fotógrafo: Sang Hyun Cho. Fonte: Pixabay.

Antes de se iniciar o debate do problema aqui colocado, convém tornar a discussão um pouco mais concreta com o auxílio de alguns exemplos reais. Provavelmente, perto da residência ou do local de trabalho do leitor existia algum pequeno negócio (por exemplo, um salão de beleza ou um restaurante) que ele frequentava; ou talvez o leitor fosse o proprietário de ou trabalhava em um desses empreendimentos. Parte considerável dessas pequenas firmas se defronta com a falência, ao passo que os seus funcionários são ameaçados pelo desemprego. O vídeo abaixo também é ilustrativo: uma cidadã foi presa por estar sentada sozinha (e sem ninguém por perto) em um banco de uma praça na cidade paulista de Araraquara.

Um ponto essencial na presente discussão é o fato de que o governo federal e os governos estaduais e municipais somente podem fazer aquilo que as normas legais afirmam que eles estão autorizados a fazer. Por exemplo, o poder público não pode estabelecer um limite para o tamanho dos textos disponibilizados neste blog. E isso é verdade seja lá qual for a motivação para a imposição de tal limite. Mais ainda: se alguma lei supostamente autorizar um governante a fazer algo que acarrete a violação de um direito reconhecido na constituição federal, então essa lei não tem valor (ou seja, ela é inconstitucional).

Em decorrência do confinamento houve uma considerável supressão da liberdade de ir e vir; diversos pequenos empreendimentos foram, para todos os fins, condenados à falência. Para onde quer que se olhe, encontrar-se-ão indivíduos com liberdades tolhidas e entidades arruinadas pela referida política. Cabe aqui a seguinte indagação: será que o poder público tem, de acordo com a legislação brasileira, o poder de fazer tudo isso?

Um texto de autoria de Bruno Carpes, promotor de justiça no Rio Grande do Sul, aborda justamente o problema discutido neste post. Na sua visão, a determinação de fechar grande parte do comércio é juridicamente sólida. Porém, o mesmo não se pode dizer sobre as restrições ao direito do cidadão de se deslocar. Segundo ele, “decretos que tragam determinações de proibição de deslocamento, caminhadas, isto é, de liberdade de ir e vir, mostram-se flagrantemente inconstitucionais”. O leitor que desejar uma discussão mais profunda desse assunto pode acessar o referido texto neste link.

A avaliação dos ônus sociais da política de confinamento e da sua eficácia em combater a pandemia ainda é um problema em aberto. Contudo, a sua legalidade é bem menos dúbia. Independentemente dos referidos custos e benefícios, algumas das medidas integrantes da dita política são claramente ilegais.


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